K-Teoria de operadores pseudodiferenciais
com símbolos semi-periódicos no cilindro
Patricia Hess
Tese apresentada
ao
Instituto de Matemática e Estatística
da
Universidade de São Paulo
para
obtenção do título
de
Doutor em Ciências
Programa: Matemática Aplicada
Orientador: Prof. Dr. Severino Toscano do Rego Melo
Durante o desenvolvimento deste trabalho a autora recebeu auxílio financeiro do CNPq
São Paulo, dezembro de 2008
K-Teoria de operadores pseudodiferenciais
com símbolos semi-periódicos no cilindro
Este exemplar corresponde à redação
final da tese devidamente corrigida
e defendida por Patricia Hess
e aprovada pela Comissão Julgadora.
Banca Examinadora:
- •
Prof. Dr. Severino Toscano do Rego Melo (orientador) - IME-USP
- •
Prof. Dra. Cristina Cerri - IME-USP
- •
Prof. Dra. Beatriz Abadie - URU
- •
Prof. Dr. Antônio Roberto da Silva - UFRJ
- •
Prof. Dr. Ricardo Bianconi - IME-USP
Agradecimentos
Agradeço a todos aqueles que sempre me incentivaram e apoiaram, em especial, ao professor Toscano, por ter aceito ser meu orientador e estar sempre disposto a me ajudar; aos amigos que fiz nestes últimos anos, por tornar a minha estadia em São Paulo tão agradável; e por fim, ao professor Daniel Gonçalves, que, embora não tenha seu nome citado na banca examinadora, esteve presente à defesa e colaborou com muitas sugestões.
Resumo
Seja a C*-álgebra dos operadores limitados em gerada por: operadores de multiplicação por funções , operadores de multiplicação por funções operadores de multiplicação por funções contínuas -periódicas, onde é o Laplaciano de e para e . Calculamos a K-teoria de e de , onde é o ideal dos operadores compactos em .
Palavras-chave: K-teoria, Operadores pseudodiferenciais.
Abstract
Let denote the C*-algebra of bounded operators on generated by: all multiplications by functions , all multiplications by functions all multiplications by -periodic continuous functions, where is the Laplacian on and , for and . We compute the K-theory of and , where is the ideal of compact operators on .
Keywords: K-theory, Pseudodifferential operators.
Introdução
Este trabalho tem como objetivo calcular a K-teoria da C*-álgebra de operadores limitados em gerada pelos operadores: (i) de multiplicação por funções que se estendem continuamente para , (ii) de multiplicação por funções contínuas em de período , (iii) onde é o operador Laplaciano em e (iv) para e .
Para calcular a K-teoria de , é importante conhecer a estrutura desta álgebra. Desta forma, o capítulo 1 é destinado essencialmente a descrever sua estrutura, apresentando diversos resultados de [10] restritos ao caso
A C*-álgebra não é comutativa, e seus comutadores não são todos compactos. Temos então que o ideal comutador de contém o ideal dos operadores compactos e além disso, temos o seguinte isomorfismo:
(1) |
Compondo com o isomorfismo acima, conseguimos estender esta aplicação e obter um *-homomorfismo
que nos será muito útil nos cálculos das aplicações de conexão em K-teoria.
Apresentamos ainda, no capítulo 1, o isomorfismo entre a álgebra comutativa e o conjunto das funções contínuas em tomando valores complexos, denotado por , sendo um subconjunto compacto de , onde este isomorfismo se dá pela aplicação de Gelfand. Note que também representa o círculo, mas preferimos distinguí-lo do círculo proveniente da variedade. A composição da projeção canônica com este isomorfismo nos dá a aplicação que denominamos de símbolo, isto porque esta aplicação é dada pelo símbolo principal dos operadores em .
Apesar de termos todas estas informações sobre , elas não foram suficientes para o cálculo de sua K-teoria. Definimos então, no capítulo 2, duas C*-subálgebras de , as quais denominamos e e tais que
Estas álgebras não são comutativas e não contêm a álgebra dos operadores compactos em , denotada por Determinamos seus ideais comutadores e mostramos os seguintes isomorfismos:
O resultado mais importante deste capítulo é que a C*-álgebra tem estrutura de produto cruzado e este teorema segue como uma generalização do teorema 8 de [14].
No terceiro e último capítulo, apresentamos os cálculos de K-teoria das álgebras e Partindo da seqüência induzida pela aplicação do símbolo quocientada pelo ideal
conseguimos calcular a aplicação do índice da seqüência exata de seis termos em K-teoria:
Analogamente a proposição 3 de [14], conseguimos mostrar que calculado num elemento é igual a cujo operador é uma projeção de posto 1 de e ind é o índice de Fredholm. Para calcular este índice, usamos uma particularização da fórmula do índice para operadores elípticos de Atiyah-Singer dada por Fedosov [7], no caso em que a variedade tem Todd class igual a 1. Esta fórmula determina o índice do operador a partir de seu símbolo, fazendo com que não precisemos entrar em argumentos topológicos, necessários na fórmula de Atiyah-Singer.
Para calcular e de e , usamos a mesma idéia acima, mas foi com a seqüência de Pimsner-Voiculescu [16] que conseguimos concluir que
Com todos estes resultados e a partir do cálculo da K-teoria do ideal comutador , provamos que existe um operador de Fredholm cujo índice é igual a 1. Diante disso, conseguimos mostrar que a aplicação do índice da seqüência exata de seis termos em K-teoria associada a seqüência
é sobrejetora. E esta informação foi crucial para chegarmos ao resultado desejado.
No trabalho de Melo e Silva [14], eles determinam a K-teoria da C*-álgebra gerada por: (i)operadores de multiplicação por funções que admitem extensões contínuas em , (ii) os operadores descritos em (i) conjugados com a transformada de Fourier , e (iii) multiplicadores por funções contínuas de período . Eles apresentam duas maneiras diferentes para calcular a K-teoria de Uma delas se baseia na seqüência exata proveniente da aplicação do símbolo principal, onde se conhece o núcleo dessa aplicação e sua imagem. A outra, surge da seqüência exata induzida pela aplicação que chamamos de , que estende o homomorfismo sobrejetor
Apesar de conhecermos o núcleo e a imagem de a seqüência induzida por esta aplicação não nos possibilitou ir adiante no cálculo da K-teoria de e trabalhamos apenas com a seqüência do símbolo. Mas o que é importante ressaltar, é que tivemos que construir várias outras seqüências envolvendo a álgebra, seu comutador e para podermos inferir algo.
De um modo geral, o que usamos para calcular a K-teoria de são argumentos bem conhecidos, que estão associados ao símbolo principal e ao símbolo principal de fronteira, ao qual chamamos de no nosso trabalho. Conhecer a imagem e o núcleo desses símbolos é uma ferramenta que nos possibilita o cálculo da K-teoria de uma C*-álgebra , como pode ser visto nos trabalhos de Melo, Nest e Schrohe [12] e Melo, Schick e Schrohe [13]. A estrutura da álgebra se assemelha a estrutura das álgebras estudadas em [12] e [13] e de tantas outras C*-álgebras geradas por operadores pseudodiferenciais de ordem zero (ver por exemplo [1], [2], [8], [9], [10] e [15]).
Apesar de termos estudado a K-teoria de apenas em , suspeitamos de que vários resultados podem ser generalizados para , onde é uma variedade Riemanniana compacta de dimensão n. Mas este é uma assunto que pretendemos abordar num trabalho futuro.
Capítulo 1 A C*-álgebra
Começaremos este primeiro capítulo definindo a C*-álgebra com a qual iremos trabalhar, e descrevendo vários resultados já conhecidos sobre ela. Melo, [10], e Cordes, [2], estudaram esta álgebra e deles obtemos informações necessárias para o cálculo da K-teoria de .
Nas duas primeiras seções, introduziremos como uma C*-subálgebra de operadores limitados em cujas funções em são complexas e é uma variedade Riemanniana compacta de dimensão . Na terceira seção, nos restringiremos ao caso em que é o círculo e a partir de então este será o caso que iremos estudar nos próximos capítulos.
No decorrer do trabalho, usamos duas notações para o círculo. denota um círculo qualquer e corresponde especificamente à variedade escolhida no lugar de .
1.1 Descrição de
Considere uma variedade Riemanniana compacta. Escreva e seja o operador Laplaciano definido em . Definimos a álgebra como sendo a menor C*-subálgebra de contendo
-
(i)
operadores de multiplicação por
-
(ii)
operadores de multiplicação por onde representa o conjunto das funções contínuas em que possuem limite quando
-
(iii)
operadores de multiplicação na primeira variável por funções contínuas -periódicas ;
-
(iv)
-
(v)
com
-
(vi)
onde é um operador diferencial de primeira ordem em .
Com o intuito de facilitar a notação, denotemos por os operadores (ou classes de operadores) listados nos itens (i), (ii), …, (vi) acima, respectivamente.
Usando a estrutura de espaço de Hilbert de , temos que este é isomorfo a 111 significa o espaço de Hilbert proveniente do produto tensorial entre e . Podemos então conjugar a álgebra com o operador unitário definido em ,
onde é a transformada de Fourier em
e denota o operador identidade em Esta conjugação será útil daqui em diante para obtermos uma série de resultados sobre
Vamos denotar um operador do tipo onde e é o operador identidade em e onde é o operador identidade em e apenas por e , respectivamente, deixando sempre claro a que espaço cada um deles pertence.
Seja a C*-álgebra conjugada por e para cada , está listado a seguir.
-
(i’)
-
(ii’)
-
(iii’)
onde para e ;
-
(iv’)
;
-
(v’)
;
-
(vi’)
Podemos considerar a álgebra das funções contínuas de limitadas que tomam valores em , denotada por , como uma subálgebra de no seguinte sentido: uma função em é identificada com operador de multiplicação em definido por
para . Note que .
As funções
(1.1) |
com , estão em (isto será demonstrado mais adiante no lema 2.1). Assim, obtemos os operadores
opb de multiplicação pelas funções E estes operadores são exatamente os encontrados nos itens (iv’), (v’) e (vi’), respectivamente.
Para simplificar a notação, vamos escrever o conjunto dos operadores limitados em por , e o conjunto dos operadores compactos em por , para uma variedade qualquer.
1.2 O ideal comutador de
Definição 1.1.
Chamamos de ideal comutador de uma C*-álgebra ao ideal fechado gerado pelos comutadores para todo e em
Sejam o ideal comutador de e o ideal comutador de . É claro que
A proposição 1.2 de [10] nos dá uma descrição do ideal comutador de
Proposição 1.2.
O ideal comutador de é o fecho do seguinte conjunto de operadores:
onde representa o operador de multiplicação pela função
Considerando o fecho do conjunto
podemos também escrever o ideal como sendo
onde este produto tensorial entre C*-álgebras é único, pois é nuclear.
Temos em [10], teorema 1.6, o isomorfismo entre e duas cópias de . Antes de enunciá-lo, daremos uma breve idéia da construção necessária para chegar a este resultado (a demostração completa pode ser encontrada com todos os detalhes em [10]).
Para cada real, seja o operador em dado por onde com , e seja o operador em da seguinte forma:
onde é a transformada de Fourier discreta
Então é um operador unitário que satisfaz se e
Seja uma função em Defina para cada em a seqüência em
( para quase todo pelo Teorema de Fubini, pois pode ser visto como ). Podemos definir então o operador unitário
(1.2) |
Denote a C*-subálgebra de gerada por
-
(i)
operadores de multiplicação por funções em ;
-
(ii)
operadores do tipo onde é um operador definido em de multiplicação pela seqüência , com limite quando
contém o ideal e todos os seus comutadores são compactos ([3], capítulos V e VI e [4]). Temos ainda de [10], que vale o isomorfismo . Compondo-o com a projeção canônica obtemos a seguinte aplicação:
Temos então a seguinte proposição 1.5 de [10]:
Proposição 1.3.
A aplicação
é um -isomorfismo. Para em da forma , com em em e temos
(1.3) |
Para cada , denota o operador compacto em de multiplicação pela seqüência em .
Denotando por o conjunto das funções definidas em que tomam valores em enunciamos o teorema 1.6 de [10].
Teorema 1.4.
Existe um -isomorfismo
(1.4) |
Demonstração.
Tome como sendo a composta da seqüência de aplicações abaixo:
onde (1) representa a aplicação (2) leva este último elemento em e (3) é o -isomorfismo:
∎
1.3 O caso
Desta seção em diante, estudaremos o caso em que a variedade é o círculo, apesar dos resultados apresentados nessa seção serem válidos para uma variedade compacta de dimensão .
A classe de geradores denotados por na definição da C*-álgebra pode ser substituída pelo operador
já que a variedade tem fibrado tangente trivial.
Definiremos nesta seção duas aplicações de num certo espaço de funções contínuas. Estas aplicações são -homomorfismos muito importantes e serão muito citadas no último capítulo.
Definição 1.5.
Seja uma C*-álgebra e seu ideal comutador. Chamamos de espaço símbolo de ao espaço de ideais maximais da álgebra comutativa .
Definição 1.6.
Chamamos de -símbolo de uma C*-álgebra a aplicação
que é dada pela composição da projeção canônica com a transformada de Gelfand da C*-álgebra onde é o ideal comutador de
Dado um elemento em , chamaremos de símbolo de a função contínua associada ao elemento módulo Enunciaremos agora o teorema 2.2 de [10], restrito ao caso , que descreve o espaço símbolo de e nos dá os símbolos de seus geradores.
Teorema 1.7.
O espaço símbolo de é o subconjunto de dado por
onde o elemento pertence ao fibrado das coesferas de Com esta descrição de os -símbolos da classe dos geradores da C*-álgebra calculados em são respectivamente dados por
(1.5) |
Vejamos agora que todo operador A em determina um operador limitado de já que é um ideal de Fica bem definido então o operador abaixo:
onde
Seja o conjunto das funções contínuas em que tomam valores em Identificando as funções em com os operadores de multiplicação correspondentes em temos da proposição 2.9 de [10] que a imagem de está contida em Obtém-se então o seguinte -homomorfismo dado em [10], proposição 2.4:
Proposição 1.8.
Existe um -homomorfismo
(1.6) | |||||
tal que, para é dado respectivamente por:
onde são operadores de multiplicação pela seqüências para ’s dadas em (1.1).
Podemos notar que a imagem de restrita a é o conjunto , e para .
Capítulo 2 C*-subálgebras de
Neste capítulo, definiremos duas C*-álgebras de as quais denotaremos por e Determinaremos seus ideais comutadores e espaços símbolo.
Mostraremos um resultado análogo ao que foi feito em [14], teorema 8, onde Melo e Silva mostraram que uma C*-álgebra , gerada por um certo tipo de operadores de multiplicação, é isomorfa ao produto cruzado onde é dada pela translação por um. Verificaremos que tem estrutura de produto cruzado, isto é, existe um isomorfismo entre e para uma ação de por automorfismos de .
Conhecendo um pouco da estrutura destas álgebras, estaremos aptos a calcular suas K-teorias no próximo capítulo.
2.1 A álgebra
Chamemos de a C*-subálgebra de gerada por:
-
(i)
operadores de multiplicação com
-
(ii)
-
(iii)
com
-
(iv)
com
Com base no que foi feito no capítulo anterior, descreveremos o ideal comutador e o espaço símbolo de .
Os geradores do item (i), quando conjugados com a transformada de Fourier , não sofrem nenhuma alteração. Já os geradores dos itens (ii), (iii) e (iv) conjugados com são os operadores e descritos no início do capítulo 1, página 1.1. Denotemos por a álgebra conjugada com transformada de Fourier.
Lema 2.1.
Para cada pertence ao conjunto
Demonstração.
Como ([2], proposição 1.1), então fica claro que está em
Como e então estas funções também são contínuas em
Para mostrarmos que, para cada real, os operadores e estão em , primeiro vamos conjugá-los com a transformada de Fourier discreta e , e então mostrar que e são operadores limitados em
Os operadores são operadores de multiplicação pelas seqüências
respectivamente. Calculando a norma destes operadores, temos:
Logo, e são operadores limitados em . Como a conjugação é um isomorfismo, temos que e são operadores limitados em e portanto as funções e pertencem a
∎
Para conhecer a estrutura da C*-álgebra e podermos descrever seu espaço símbolo, primeiro encontraremos um isomorfismo entre a álgebra gerada pelos operadores e e a álgebra de funções contínuas definidas numa compactificação de . Antes de enunciarmos o lema que nos mostra este isomorfismo, definiremos a compactificação de .
Considere a seguinte compactificação de dada em [1], página 133. Dado o homeomorfismo de na bola aberta
temos o conjunto onde é o fecho de . é a classe das funções contínuas limitadas sobre tais que a função admite uma extensão contínua em . Temos então que , onde é a compactificação de homeomorfa a .
Denotemos por o fecho de em e por a fronteira de . Vamos mostrar que é
Seja em . Então a este elemento está relacionado um único elemento pelo homeomorfismo entre e . Tome uma seqüência de racionais em que converge para de forma que Considerando então a seqüência em temos
Então,
Fica assim bem caracterizada a seguinte compactificação de
Agora podemos enunciar o seguinte lema:
Lema 2.2.
Seja a C*-álgebra comutativa gerada pelos operadores e Então
Demonstração.
Se conjugarmos os operadores com o operador obteremos operadores de multiplicação em dados, respectivamente, pelas funções definidas abaixo:
(lema 2.1). Denotando por a álgebra , podemos vê-la como uma subálgebra de .
Queremos mostrar, usando o teorema de Stone-Weierstrass, que . Como , para todo a álgebra possui unidade. Vamos verificar agora, que sempre é possível encontrar uma função em que separa pontos.
Caso 1. Sejam em . Se temos o que queríamos. Caso contrário, então ou
ou
já que ou
Caso 2. Sejam em e em . Vamos primeiro calcular em . Para facilitar as contas, suponha que está definida em todo . Temos então que admite uma extensão contínua em . Logo, para temos
Seja uma seqüência em que converge para em quando , então
já que . Assim, para qualquer Portanto,
Como
então .
Caso 3. Sejam e distintos em . Usando o mesmo raciocínio feito no caso 2, primeiramente faremos a composição das funções e com para depois podermos calculá-las em e . Para
Dada uma seqüência em que converge para em quando , temos
Assim, para qualquer e . Portanto,
Assim, ou separam pontos.
Concluímos então que é isomorfa a
∎
Observação 2.3.
Vimos no teorema 1.7 que os -símbolos dos operadores calculados em , onde são dados por , respectivamente. Note que isto coincide com os cálculos de nos pontos .
Teorema 2.4.
O ideal comutador de é .
Demonstração.
Seja o ideal comutador de .
Note que a álgebra está contida em onde foi definido no capítulo 1, página (ii). De fato, para (este operador não depende da variável real), e para pois , para
Fixado mostremos que
Primeiro, é C*-subálgebra de pois a aplicação é um C*-homomorfismo, portanto tem imagem fechada. Queremos mostrar que usando o Teorema de Stone-Weierstrass. Os operadores podem ser vistos como funções em já que
Temos ainda que separa pontos em pois
Como contém a identidade, pois então e portanto
Sabe-se de [2], proposição 1.2 e 1.3, que todos os comutadores de e seus adjuntos estão em , logo . Assim, para o conjunto Na verdade, De fato, dado pertencente a para um existe tal que Daí, para
pois está em Logo, é um ideal de não nulo contido em Segue que
Por [5], 10.4.5, temos que se os estados puros de são separados por Os estados puros de são os funcionais lineares da forma
(2.1) |
onde denota o produto interno de por , fixo e tem norma 1 (ver [5], 2.5.2 e 4.1.4, e [18], IV 4.14). Para mostrar que é suficiente mostrar que, dados dois funcionais da forma (2.1), podemos achar tal que
-
1.
Suponha . Tome tal que para e defina para cada da seguinte maneira:
Considerando os funcionais lineares em para e temos
Isto é, existe em tal que e Portanto, para reais distintos e e em , tome em para termos
-
2.
Suponha . Se e têm norma 1, então e portanto temos os mesmos estados puros. Logo, tomemos e tais que Temos então, para onde
Portanto separa os estados puros de e podemos concluir que . ∎
Denotemos por o ideal comutador de . Lembrando que podemos então escrever
Teorema 2.5.
O espaço símbolo de é homeomorfo a e os -símbolos da classe dos geradores da C*-álgebra calculados em são respectivamente dados por
(2.2) |
Demonstração.
Considere as inclusões
Temos que e são os espaços símbolo de e respectivamente, pois pelo lema 2.2, e são isomorfos. Seja a aplicação dual
As imagens de e geram então é injetora. Como é compacto, é Hausdorff e é contínua, temos que é um homeomorfismo sobre a sua imagem. Determinemos então a imagem de .
Note que
Suponha que exista Considere a aplicação do -símbolo
Associamos ao ponto um funcional linear dado pela evaluação neste ponto.
Para temos que onde é a evaluação em . Portanto,
onde .
Mas então Portanto, com esta contradição obtemos
Temos então que Vamos mostrar que vale a igualdade.
-
•
Afirmação 1: Se então para todo
Seja . Considere o operador tal que . Defina por
Assim, é um automorfismo contínuo e para , e para
Seja o funcional linear multiplicativo de associado ao ponto . Defina um novo funcional da seguinte forma:
então é o funcional linear multiplicativo de associado ao ponto . Logo, para todo .
Suponha agora que exista um ponto em que não pertença a Portanto, pela afirmação acima, podemos concluir que não pertence a para todo em . Então existe uma vizinhança aberta de em tal que .
Seja em tal que e o suporte de está contido em A corresponde um único operador em Daí,
-
•
Afirmação 2: não pertence ao ideal comutador
Suponha que Então pertence a , e portanto vale o limite
Seja uma seqüência em tal que quando e . Dado , seja real tal que para todo ,
Tome inteiro tal que, para todo tem-se . Temos então para
Mas e daí absurdo!
Logo, para todo em .
Vamos agora descrever a aplicação do símbolo:
Para cada ponto existem funcionais lineares multiplicativos associado a e associado a . Como e são homeomorfos, existe um funcional linear tal que pela aplicação dual , temos e . Portanto, podemos associar a o ponto . Logo,
Escrevendo , temos
-
1.
-
2.
-
3.
Podemos ainda dizer que é igual a restrita a álgebra
∎
2.2 A álgebra do produto cruzado
2.2.1 O produto cruzado
Denote por a C*-álgebra acrescida dos operadores de multiplicação pelas funções periódicas. Denotemos por a C*-álgebra conjugada com a transformada de Fourier.
Nesta seção iremos mostrar que é isomorfa ao produto cruzado de por uma ação que definiremos abaixo.
Identificando como subálgebra de (ver demostração do teorema 2.4), considere o seguinte automorfismo de translação :
Lembre que a C*-álgebra gerada por e é isomorfa a (lema 2.2). Como é invariante por translação na variável real, então a C*-álgebra gerada por e é invariante por translação em Portanto, é invariante por translação e o automorfismo acima está bem definido.
Melo e Silva [14], teorema 8, demonstraram que a C*-álgebra , gerada por operadores de multiplicação por funções contínuas em e por multiplicadores por funções contínuas de período , é isomorfa ao produto cruzado onde é dada pela translação por um.
De forma análoga, temos o seguinte resultado.
Teorema 2.6.
Seja a ação descrita acima. Então
onde é a C*-álgebra envolvente ([5], 2.7.7) da álgebra de Banach com involução de todas -seqüências somáveis em equipadas com o produto de convolução
e involução
A demonstração deste teorema segue exatamente à feita em [14], mas apresentaremos sua prova com as devidas mudanças após a seguinte proposição, [6, proposição 2.9], a qual será necessária no decorrer da demonstração.
Proposição 2.7.
Sejam e C*-álgebras e sejam e ações de em e respectivamente. Suponha que seja um homomorfismo covariante. Se a restrição de à subálgebra dos pontos fixos é injetiva, então é injetiva.
Demonstração (teorema 2.6).
Considere como sendo o conjunto das sequências com apenas um número finito de entradas não nulas em Defina para as sequências em
onde e para em .
-
•
Afirmação: é um -homomorfismo contínuo.
Sejam e seqüências em .
-
–
Produto:
-
–
Involução:
-
–
Continuidade:
-
–
Como é contínua, é denso em e é denso em temos que existe um -homomorfismo extensão contínua de . Segue de [5], 2.7.4, que existe um -homomorfismo contínuo (ao qual chamaremos de novamente)
estendendo Vamos verificar que é um isomorfismo.
Como é fechada e contém o subconjunto que é denso em então é sobrejetora. Para mostrarmos a injetividade, usaremos a proposição 2.7.
Dados em e em , defina Novamente por [5], 2.7.4, podemos estender a um automorfismo de e obtemos então a ação do círculo em
Para em , definimos também o operador unitário em :
e obtemos uma ação de em , dada por
Temos que verificar que é covariante. Para isso, é suficiente mostrar que para cada , para Temos que o conjunto gera onde é a seqüência tal que o único elemento não nulo é 1 na posição . Assim, é suficiente mostrar que vale a igualdade apenas nos geradores.
Para mostrar que é injetiva, é suficiente mostrar que sua restrição aos pontos fixos de é injetiva.
Seja a subálgebra dos pontos fixos por ,
e seja definida por
Se , então . Assim, está contida na imagem de . Como para todo a integral temos para todo
Como é denso em e é uma subálgebra fechada de , temos que . Como então . Conhecendo e sabendo que , temos
∎
2.2.2 Ideal comutador e espaço símbolo de
Apesar de já termos uma boa descrição da álgebra , queremos também determinar seu ideal comutador e seu espaço símbolo.
A descrição do ideal comutador de é muito parecida com a de o ideal comutador da álgebra por isso pode-se notar que os cálculos usados aqui serão praticamente os mesmos.
Denote por o ideal comutador de .
Proposição 2.8.
O ideal coincide com o fecho do conjunto
Demonstração.
Primeiro vamos verificar que os comutadores dos geradores de , e seus adjuntos, estão em . É fácil ver que
para e . Em [10], temos na demonstração da proposição 1.1 que para Assim, o operador é a multiplicação pela função . Temos ainda na mesma proposição que
logo, os comutadores dos respectivos operadores são multiplicações por funções em e o mesmo vale para os adjuntos desses operadores. Portanto, está contido no fecho de
Sabemos que está contido em . Então para todo inteiro, , para em (note que é um elemento do ideal ). Assim, o fecho de está em . ∎
Podemos ainda dizer que é o fecho de
Proposição 2.9.
Demonstração.
Para inteiro e real, temos
Como , isto implica que
para em
Usando que para todo real, e que
segue que é uma função contínua em com valores em operadores compactos.
Como o mergulho de em é uma isometria e temos que
A igualdade sai por argumentos análogos usados na demonstração do teorema 2.4, que se resume a provar que para cada , e que separa os estados puros de . ∎
A próxima proposição nos dá a descrição que queríamos para o ideal comutador da álgebra .
Proposição 2.10.
e são isomorfos e este isomorfismo é dado pela conjugação por :
onde é dada em (1.3) e é a transformada de Fourier.
Considere o homomorfismo
dado por para todo Então restrito a tem imagem igual a .
Proposição 2.11.
O espaço símbolo de é homeomorfo a e a aplicação do símbolo é dada por
e
Demonstração.
Considere as inclusões
onde é o conjunto das funções contínuas -periódicas.
Sabendo que e são os espaços símbolo de e , respectivamente, temos a aplicação dual
onde será um homeomorfismo sobre a sua imagem.
A idéia agora é fazer o mesmo para a álgebra , apesar de já conhecermos o seu espaço símbolo. Sejam
as inclusões canônicas. A aplicação dual é dada por
No teorema 1.7, temos uma descrição de , que também pode ser escrito como , onde o conjunto . Temos ainda que é homeomorfo a .
Dado o funcional linear multiplicativo correspondente ao ponto , queremos mostrar que é o funcional linear associado ao ponto
Para isto, basta mostrar que onde são os geradores de Sabemos que :
-
1.
-
2.
-
3.
-
4.
-
5.
Para calcularmos , temos de voltar para a aplicação dual
lembrando que e vêm da demonstração do espaço símbolo de .
Para , o operador de multiplicação pela função contínua de período , é igual ao funcional calculado em . Como os funcionais lineares multiplicativos de são dados pela evaluação num ponto de , então vamos associar ao funcional o ponto Logo,
Para calcularmos , para , temos que
Também neste caso, os funcionais lineares multiplicativos de são dados pela evaluação num ponto de , então associamos a o ponto Logo,
Como e é um funcional linear em então
Temos ainda que é um funcional em e portanto, a ele está associado um par pelo teorema 2.5, e portanto
Logo, dado fica bem definido o funcional em para todo Portanto, a imagem de é igual a e
∎
Capítulo 3 A K-Teoria de e suas C*-subálgebras
Este último capítulo consiste no cálculo da K-teoria da C*-álgebra onde .
Apresentaremos primeiro alguns conceitos básicos sobre esta teoria e resultados importantes que serão úteis nas próximas secões. Recomendamos [17] e [19] como literatura neste assunto.
Começaremos calculando a K-teoria das subálgebras e Para isso será fundamental analisar a seqüência de Pimsner-Voiculescu construída a partir da realização de como um produto cruzado.
Conhecer a K-teoria de nos fornecerá uma das informações necessárias para conseguirmos determinar a K-teoria de Um dos resultados mais interessantes deste último capítulo, seção 3.3, é o cálculo do índice de certos operadores de Fredholm, usando a fórmula do índice de Fedosov, uma particularização da fórmula de Atiyah-Singer. Este cálculo é necessário para determinar a aplicação do índice de uma dada seqüência exata de seis termos em K-teoria induzida por uma seqüência exata curta envolvendo .
3.1 Conceitos básicos
Seja uma C*-álgebra. Denotaremos por a unitização de . Dado um natural, seja o conjuntos das matrizes com entradas em . Considerando o conjunto das projeções em e o conjunto dos elementos unitários em , usaremos a seguinte notação:
De uma forma resumida, podemos definir a K-teoria de C*-álgebra pelos funtores e que associam a uma C*-álgebra dois grupos abelianos e . O grupo pode ver visto como diferenças formais de classes de equivalência de projeções , onde é a parte escalar de . é o grupo de classes de homotopias de unitários (ou inversíveis) em
Uma propriedade desses funtores é que dada uma seqüência exata curta de C*-álgebras,
associamos a ela uma seqüência exata de seis termos com os seus K-grupos
onde e são as aplicações induzidas funtorialmente, é dita aplicação do índice e é a aplicação exponencial.
Definição 3.1.
([19], Definição 7.2.1) A suspensão de uma C*-álgebra é a C*-álgebra
Nos três últimos objetos, soma e produto são pontuais, adjunto é dado pelo complexo conjugado e a norma é a norma do supremo. O produto tensorial significa o produto tensorial entre C*-álgebras completado.
A seguir, enunciaremos um isomorfismo em K-teoria que envolve a álgebra e sua suspensão.
Teorema 3.2.
Os grupos e são isomorfos para toda C*-álgebra O isomorfismo, ao qual denotaremos por tem a seguinte descrição: dado um unitário , existem unitários que forma uma homotopia entre e
Isto dá origem a um caminho de projeções
com e . A aplicação pertence a e para todo . Temos então que
Observação 3.3.
Para unitário, basta tomar ([19], Teorema 7.2.5, Teorema 4.2.9), onde
Neste trabalho, vamos caracterizar a suspensão pelas funções definidas no círculo por ser mais conveniente para os nossos cálculos. Sendo assim, para unitário, a função definida acima em função de deve ser uma função com domínio em . Vamos então descrevê-la em função desta nova variável.
Fazendo estas contas, obtemos uma matriz em função de e
Seja , e Usando as igualdades trigonométricas, e , e em seguida, e , obtemos as relações
Substituindo estas igualdades na matriz anterior, temos que é dada por
Denotemos por , para unitário em e em , a seguinte matriz
(3.2) |
Outro resultado importante em K-teoria é a Periodicidade de Bott. Esta garante que e são isomorfos e este isomorfismo é da seguinte forma. Para todo e para toda projeção , define-se uma aplicação por
Obtemos assim a aplicação de Boot:
Um resultado que usaremos constantemente nos cálculos de K-teoria é que, dada a seqüência exata curta cindida
onde é a inclusão, é a evaluação no ponto 1 e é tal que , então vale que
onde e são as aplicações induzidas.
Para o cálculo da aplicação do índice, temos o seguinte lema.
Lema 3.4.
([14], Lema 1) Seja uma álgebra de Banach unital e seja a aplicação do índice da seqüência exata de seis termos em K-teoria associada a seqüência exata curta . Se é um inversível, e então
No caso em que é o ideal dos operadores compactos de uma C*-algebra onde é um espaço de Hilbert, temos que a aplicação do índice da seqüência abaixo
é dada pelo índice de Fredholm, isto é,
onde é o índice de Fredholm do operador ([17], proposição 9.4.2).
3.2 A K-teoria de
Começaremos os cálculos pela menor álgebra. Considere a seguinte seqüência exata curta:
(3.3) |
onde i é a inclusão e é a projeção canônica.
O teorema 2.4 nos dá o isomorfismo entre e Sabendo que e e que vale então podemos facilmente concluir que
Proposição 3.5.
e são ambos isomorfos a .
Demonstração.
Antes de calcularmos estes grupos, observe que pelo teorema 2.5, temos o seguinte isomorfismo
Vamos primeiro calcular e e depois, pelo isomorfismo entre os grupos, determinar e de .
Note que . Assim podemos construir a seqüência exata curta cindida envolvendo e sua suspensão:
onde é a inclusão, é a evaluação no ponto 1 e é tal que .
Então vale que
(3.4) |
onde e são as aplicações induzidas.
É conhecido que onde é um gerador do grupo e 1 representa a função em Temos ainda que onde é um gerador de e x é a função identidade em . Sabendo disso, estamos aptos a calcular usando a igualdade (3.4).
-
•
Calculando no gerador de , temos
Vamos representar este gerador de novamente por , mas entendendo que se trata de Assim, .
Passemos ao cálculo de . Sabemos que com o isomorfismo dado no teorema 3.2 e ainda, conhecemos o gerador do grupo Temos então que
Logo,
(3.5) -
•
Para calcular , calculemos num gerador:
Como a função não depende da variável de , podemos então escrever que
O grupo é determinado a partir da aplicação de Bott. Dado o isomorfismo e conhecendo o gerador de , temos
onde w representa a função identidade em Observe que esta função não depende da variável em .
Assim, concluímos que
(3.6)
Vamos agora determinar os geradores destes grupos. Tomando a classe em correspondente a respectiva função em por , conseguimos encontrar os geradores de
onde Q agora é definida para operadores em
(3.7) |
∎
Associada à seqüência (3.3), temos a seqüência exata de seis termos em K-teoria
(3.8) |
A descrição que temos do isomorfismo não é explicita o suficiente para nos permitir saber exatamente qual é a imagem de . Como
temos que pertence ao núcleo de .
Portanto, apenas uma das seguintes possibilidades se verifica:
-
1.
Se então Temos ainda a seqüência exata curta
Como é um módulo livre, então esta seqüência cinde e como é abeliano, podemos então escrever como a seguinte soma direta:
-
2.
Se corresponder a um inteiro pelo isomorfismo , temos que
e portanto Podemos ainda escrever a seqüência
onde . Como é um módulo livre e os grupos são todos abelianos, então podemos escrever como a soma direta .
3.3 A K-teoria de
A idéia usada na seção anterior será reproduzida aqui para calcular os K-grupos de . Começamos construindo a seqüência exata curta envolvendo a álgebra e seu ideal comutador:
(3.9) |
Do teorema 2.10, temos o isomorfismo entre e . Considere a seqüência exata cindida
onde Então,
(3.10) |
onde o isomorfismo é induzido por e é uma projeção de posto 1 de e
pela aplicação de Bott. Portanto
Proposição 3.6.
e .
Demonstração.
Pela proposição 2.11, conhecemos o espaço símbolo de . Comecemos então determinando e de (mudamos a ordem do produto cartesiano por ser mais conveniente para nós). Para facilitar os nossos cálculos, vamos reescrever como Lembrando que é o espaço símbolo das funções -periódicas, temos que e
Com base no que foi feito na demonstração da proposição 3.5 podemos concluir que
e
Observe que aqui trabalhamos com círculos (de origem) diferentes daqueles da proposição 3.5, mas os cálculos são os mesmos.
Denote Agora usamos a seqüência envolvendo a suspensão de
Então
Com esta igualdade, podemos calcular
-
•
Vamos calcular nos geradores de
Para calcular usamos o isomorfismo
Assim, podemos concluir que é igual a
(3.11) -
•
em :
Usamos o isomorfismo de Bott para determinar os geradores de
onde w é a função identidade de e
onde representa a matriz identidade de dimensão 2. Temos então que é igual a
(3.12)
Para determinarmos os geradores de e de , usamos o símbolo . Considerando como em 3.7 definida para operadores de , segue que
onde é o operador de multiplicação dado por
e , são dados por:
∎
Para obtermos a K-teoria de , vamos calcular as aplicações exponencial e do índice para a seqüência exata de seis termos em K-teoria abaixo:
(3.13) |
Para determinar , conseguimos mostrar que vale a proposição análoga da proposição 3 de [14] para .
Proposição 3.7.
Seja em tal que seja inversível em Então é um operador de Fredholm em para todo e
onde denota o índice de Fredholm e é uma projeção de posto 1 em .
Demonstração.
Seja em tal que e pertençam a Pela proposição 2.10, e pertencem a . Assim, para cada possui um elemento inverso, módulo e portanto é um operador de Fredholm em
Considerando a aplicação dada pela projeção canônica , tome uma pré-imagem para Seja em tal que então é uma pré-imagem para Usando o lema 3.4 e o isomorfismo 3.10, temos que é igual a
Para a seqüência exata
temos que a aplicação do índice é dada pelo índice de Fredholm. Assim,
Mas pelo lema 3.4, é dada pela mesma matriz de . Logo,
∎
Teorema 3.8.
A aplicação em (3.13) é sobrejetora.
Demonstração.
Calculemos nos geradores de É fácil ver que os operadores de multiplicação são unitários em e portanto são pré-imagens para . Logo,
Usaremos a proposição 3.7 para calcular nos outros dois geradores. Observe que significa com Para o elemento , temos que em é o operador de multiplicação pela seqüência
(3.14) |
O próximo passo é calcular o índice de Fredholm deste operador. Para isso, podemos vê-lo como um operador em e assim conjugá-lo com , ou seja, a conjugação pela transformada de Fourier discreta ocorrerá apenas em . Obtemos portanto, um operador em de multiplicação pela seqüência
Agora vamos calcular a dimensão do núcleo deste operador:
Concluímos então que a dimensão do núcleo é 1. Usando o mesmo raciocínio, concluímos que a dimensão do núcleo de seu adjunto também é 1. Portanto,
Logo,
Explicaremos primeiro os passos a serem tomados para o cálculo do índice do operador , para depois efetuá-lo.
A idéia será conjugar este operador com a transformada de Fourier discreta na variável inteira e obter um operador de Temos que a variedade é compacta e tem Todd class ([7], (11)) igual a 1. Com as hipóteses satisfeitas, usaremos a fórmula do índice para operadores pseudodiferenciais elípticos de Fedosov [7], uma particularização da fórmula de Atiyah-Singer, a qual pode ser escrita em termos do símbolo do operador:
(3.16) |
onde é dimensão da variedade , é o fibrado das coesferas de , é o símbolo principal do operador pseudodiferencial e é uma -forma. O símbolo principal coincide com o -símbolo que definimos neste trabalho,[3] e [11].
Conjugando o operador com , temos:
com e Para ,
Lembrando que e são operadores de multiplicação pelas funções tais que , e , podemos reescrevê-las em função de :
Obtemos então o seguinte operador em
Antes de irmos para o cálculo do índice de , devemos determinar seu símbolo . Como onde representa o círculo proveniente do fibrado, temos que . Calculemos o símbolo de cada operador envolvido em separadamente.
-
1.
-
2.
-
3.
-
4.
-
5.
No integrando temos
Chamando de então
onde
A partir daqui usamos o software Maple para resolver diversos cálculos, como as derivadas parciais, os produtos de matrizes, o traço e por último a integral da fórmula (3.16). No apêndice pode ser encontrado os comandos usados para fazer estes cálculos. O valor da integral é e portanto o índice de é
Logo, o índice de é 1 e portanto,
Assim concluímos que é sobrejetora. ∎
Analisando a aplicação exponencial, temos que nos geradores e é igual a 0, pois estes operadores são projeções em Mas não determinamos a imagem de pelo motivo já citado no cálculo de Portanto, temos uma das seguintes possibilidades:
-
1.
Se então . Temos ainda a seguinte seqüência
Como é um módulo livre, então esta seqüência cinde. Além disso, e são abelianos. Portanto .
-
2.
Se para algum inteiro não nulo, então e onde
3.3.1 A seqüência de Pimsner-Voiculescu
No teorema 2.6, vimos que existe um isomorfismo onde é o automorfismo de translação por 1, e . Em [16], teorema 2.4, Pimsner e Voiculescu obtiveram uma seqüência exata de seis termos envolvendo apenas os K-grupos da álgebra inicial e da ágebra do produto cruzado.
onde é a aplicação identidade em , é o automorfismo de translação por -1 e é a inclusão.
Esta nova seqüência nos fornecerá mais respostas sobre a K-teoria de e . Observe que é a aplicação de inclusão de em . Denotando novamente por esta inclusão, podemos reescrever a seqüência exata de Pimsner-Voiculescu como abaixo:
(3.17) |
Temos que , pois e são homotópicas. De fato, considere dada por . Então e e é contínua em para cada pois
Obtemos então, as seguintes seqüências exatas
Estas por sua vez, podem ser reescritas em função de e , já que e
Das possibilidades que tínhamos para página 2, e , página 2, as únicas que fazem sentido na seqüência acima são
com inteiros positivos não nulos.
O grupo tem como gerador , onde é o operador identidade de Assim, onde é o operador identidade de , e como é um dos geradores de isso garante que
Logo,
onde e são iguais a 1.
Deste resultado segue o seguinte corolário.
Corolário 3.9.
A aplicação é sobrejetiva.
Demonstração.
Como então ∎
3.4 A K-teoria de
Nesta última seção, apresentaremos a K-teoria de e de onde representa o ideal dos operadores compactos em . Construiremos três seqüências exatas envolvendo estas álgebras e o ideal comutador de , e a partir das seqüências exatas de seis termos em K-teoria, vamos calcular as aplicações de conexão.
Considere a seqüência exata curta
(3.18) |
onde i é a inclusão e é a projeção canônica. No capítulo 1 vimos que é o núcleo da aplicação e é isomorfa a .
Primeiro vamos determinar os grupos e de
Já sabemos que e então
Agora partimos para o cálculo dos K-grupos de Como é o espaço símbolo de se conhecermos e de usando o -símbolo obteremos o resultado desejado.
O próximo lema é um resultado de [14], Proposição 1, que nos dá a K-teoria da álgebra , onde é o subconjunto de que consiste dos pontos tais que se .
Sejam as funções definidas da seguinte forma:
e
(Note que se então )
Lema 3.10.
e
Proposição 3.11.
Temos que e são ambos isomorfos a
Demonstração.
Primeiro vamos mostrar que e
Com a descrição de dada no final do capítulo 1, no caso , podemos escrever como Conseguimos então o seguinte isomorfismo
Esta descrição de será fundamental para os nossos cálculos. Inicialmente, vamos determinar a K-teoria de para depois determinar a de
Lembrando que a seqüência exata
cinde, então vale que
-
•
Já sabemos que então
Conhecemos o isomorfismo entre e Temos então que
Logo
(3.19) -
•
Sabendo que então
Vamos usar a aplicação de Bott para conhecer
onde x é a função identidade
Temos então que
(3.20)
Conhecendo os grupos dados em (3.19) e (3.20), podemos partir para a próxima seqüência exata cindida:
Daí,
-
•
Chamemos Comecemos calculando
Fazendo , temos
(3.21) -
•
Chamando ainda de o conjunto conhecemos em (3.20) o grupo . Assim, podemos calcular facilmente
Para conhecermos , calcularemos a aplicação de Bott nos geradores do grupo .
Temos então, para ,
Como já sabemos que
Vamos agora determinar os geradores destes grupos usando o -símbolo. Para cada função definida em acharemos a sua respectiva pré-imagem em
onde é o operador identidade e e são operadores de multiplicação pelas funções e , respectivamente. Lembrando que no teorema 1.7 a ordem das variáveis apresentada em é temos
-
i.
onde ;
-
ii.
onde , isto é, operador de multiplicação pela parte real de ;
-
iii.
onde , isto é, operador de multiplicação pela parte imaginária de ;
-
iv.
-
v.
Assim, os geradores de e são
e
∎
Da seqüência exata curta (3.18), temos a correspondente seqüência exata de seis termos em K-teoria:
(3.23) |
Nossos esforços se concentram em descobrir e Para isto, devemos calcular a aplicação exponencial e a aplicação do índice .
Novamente aqui, a descrição que temos do isomorfismo não nos permite determinar exatamente a imagem de . Apesar disso, temos a seguinte proposição que nos garante que é diferente de zero.
Proposição 3.12.
A aplicação em (3.23) é não nula. Além disso, via o isomorfismo
o elemento pertence à imagem de . Isto é, existe um elemento tal que este corresponde ao elemento .
Demonstração.
Pelo corolário 3.9 sabemos que é sobrejetora. Portanto existe um elemento tal que corresponde a 1 pelo isomorfismo
Conhecemos os geradores de e sabemos que calculado em e em é zero, pois e são projeções em . Os outros dois geradores são e
Assim, podemos escrever como sendo a soma
com Calculando em temos que
pois nos outros geradores, se anula. Podemos então assumir que com e inteiros não nulos simultaneamente.
Os geradores de , nos quais não calculamos , são
Dados os isomorfismos e , sabemos que estes induzem isomorfismos e nos grupos. Queremos mostrar que
Pela definição da aplicação exponencial, dado
já que é uma pré-imagem auto-adjunta em de Então,
e calculando neste elemento, temos
A aplicação é da forma para todo . Assim, é igual a matriz
Portanto,
Considere agora a aplicação calculada em . Pela definição temos
O isomorfismo é tal que para todo Então,
Como , então para todo e portanto temos
(3.26) | |||||
para todo . Logo
para todo Agora, para todo , então
Isto implica que é igual a
para todo .
Como e pra todo , podemos concluir que
De forma análoga, podemos concluir que
Vamos calcular agora em Como e para todo , e seguindo o mesmo raciocínio de cálculos feito acima, temos
Podemos então concluir que, para
temos
para Logo, o elemento corresponde ao par ∎
Da proposição anterior, podemos concluir também que se corresponde a um inteiro , então e
Partimos agora para o cálculo de . A proposição 3 de [14] pode ser novamente reescrita a esta álgebra, em que .
Proposição 3.13.
Seja em tal que seja inversível em Então e são operadores de Fredholm em para todo e
onde denota o índice de Fredholm e é uma projeção de posto 1 em .
Demonstração.
A demonstração desta proposição é análoga à feita em 3.7, já que ∎
Teorema 3.14.
A aplicação em (3.23) é sobrejetora.
Demonstração.
Calculemos nos geradores de É fácil ver que os operadores de multiplicação
são unitários em , e portanto unitários em Logo,
Para calcular nos outros geradores, usaremos o resultado da proposição 3.13 . Calculando , obtemos o seguinte operador em de multiplicação pela sequência
(3.30) |
Mas este operador é igual a em (3.14) e já calculamos o seu índice. Portanto, e
Considere o gerador de Então,
pois e já sabemos que Pelos cálculos anteriores podemos concluir que
Ainda falta calcular o índice de neste mesmo operador no ponto :
O operador é dado em (3.30). O outro operador é dado por
pois .
Conhecendo a aplicação do índice da seqüência (3.23),temos as seguintes possibilidades para os K-grupos de :
-
1.
Se é sobrejetora, temos as seqüências exatas a partir de (3.23)
o que implica que e são isomorfos a .
-
2.
Se para não nulo, temos
então e .
-
3.
Se , temos as seqüências
então e .
Passamos agora, para outra seqüência exata na tentativa de obter mais informações sobre a K-teoria de Para a seqüência abaixo
considere a seqüência exata de seis termos em K-teoria associada:
(3.33) |
Já determinamos e e temos argumentos suficientes para calcularmos e .
Proposição 3.15.
e .
Demonstração.
A proposição 1.3 nos dá o seguinte isomorfismo
Ao invés de calcularmos e de , vamos calcular os K-grupos de , já que é a estabilização da C*-álgebra ([17], 6.4) e portanto
No capítulo 1, vimos que está contido em e que A partir da seqüência exata
temos a seqüência exata em K-teoria
Sabemos que então
onde e escolhemos de tal forma que, para um inteiro fixo,
e é tal que De fato, estas são boas escolhas de e pois
Para , onde , temos
O nosso trabalho se resume a calcular que é dada pelo índice de Fredholm. Como o operador não é unitário em , vamos calcular seu índice.
Com a igualdade acima, temos que a dimensão do núcleo de é igual a dimensão do núcleo de
então a dimensão do núcleo de é igual a 0. Vamos agora calcular a dimensão do núcleo de seu adjunto:
Isto acontece pois na posição da seqüência vamos ter o elemento e e só aparecem nesta posição, e nas outras posições todos os outros elementos aparecem sozinhos. Assim, dim . Logo,
e portanto é sobrejetora.
Segue que,
como queríamos. ∎
Observação 3.16.
Com este resultado, podemos observar na seqüência
que a aplicação do índice é não nula (caso contrário, ). Se para algum inteiro não nulo. Então teríamos a seqüência
onde Note que o núcleo da aplicação é isomorfo a , mas não é um subgrupo de . Logo é sobrejetora. Além disso, esta aplicação também é dada pelo índice de Fredholm. Portanto, sabemos que existe um operador de Fredholm em que tem índice igual a . Vale ainda ressaltar que
Proposição 3.17.
A aplicação em (3.33) é sobrejetora.
Demonstração.
Pelo teorema 3.14, é sobrejetora e como temos o que queríamos. ∎
Assim, as possibilidades para e analisando a seqüência (3.33) são:
-
1.
Se então e
-
2.
Se em algum elemento de for relacionado a um inteiro não nulo pelo isomorfismo , então e
Para finalizar, enunciamos o seguinte teorema que nos dá a K-teoria das álgebras e .
Teorema 3.18.
Dada a seqüência exata curta
onde é a inclusão e a projeção canônica, podemos afirmar:
-
(i)
a aplicação do índice da seqüência exata de seis termos em K-teoria
é sobrejetora;
-
(ii)
-
(iii)
e .
Demonstração.
Sabemos que existe um operador em cujo índice de Fredholm é pela observação 3.16. Portanto, existe um operador em com índice de Fredholm igual a . Logo, onde é uma projeção de posto 1. Portanto é sobrejetora.
Como o núcleo de é e é nula, pois então Para que este isomorfismo aconteça, as únicas possibilidades para e (página 3.4) são que ambos sejam isomorfos a
Como então podemos concluir que O fato de ser isomorfo a implica que Como é o núcleo da aplicação e portanto, um subgrupo de , então e concluímos que
∎
Apêndice
Apresentamos aqui, os comandos usados no software Maple para calcular a integral dada em (3.16):
onde o símbolo principal do operador coincide com o símbolo que definimos no nosso trabalho:
(3.34) |
Obtemos então que , para
onde
O objetivo é determinar e , para depois calcular a integral.
Seguem os comandos:
-
•
(entrada da matriz )
-
•
(entrada da matriz )
-
•
(entrada da matriz )
-
•
(entrada da matriz )
-
•
(a matriz )
-
•
(3.34)
-
•
(inversa de )
-
•
(derivadas em relação a das entradas da matriz )
-
•
-
•
-
•
-
•
( matriz da derivada parcial em relação a )
-
•
(derivadas em relação a das entradas da matriz )
-
•
-
•
-
•
-
•
( matriz da derivada parcial em relação a )
-
•
(matriz onde é a derivada em relação a )
-
•
()
-
•
()
-
•
()
-
•
-
•
-
•
-
•
-
•
-
•
-
•
(simplifica a expressão - opcional!)
-
•
-
•
-
•
( integração na variável de a do traço de )
-
•
(mostra o valor da integral)
-
•
( integração na variável de a de )
-
•
(mostra o valor da integral que está em função de e )
-
•
(vamos substituir em ) -
•
-
•
-
•
( integração na variável de a do traço de )
-
•
-
•
-
•
que é igual a , portanto a integral na variável será igual a .
-
•
( integração na variável de a do traço de )
-
•
-
•
-
•
que é novamente igual a e a , portanto
Logo
Referências
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